sábado, 21 de outubro de 2017

Pedaços








Depois de alguns anos, resolvi voltar a falar de um handebol persistente, insistente, sobrevivente. De um handebol que vive na periferia, nas sobras daquilo que o Esporte institucionalizado descarta.  Nossa, e esse esporte oficial, descarta tanto...
De desejos que se cruzam nas quadras e permanecem nas horas esculpidas pela vontade de se fazer o que quer, do jeito que dá...

Às vezes, só lembranças; outras, só instantes. Todos, marcantes o bastante, para reescrevem histórias.

Um esporte, o Esporte, o handebol, são reavivados pelo tanto de emoção, de calor, de suspiro e choro que proporcionam; pela entrega que nos testa e pelos desafios que nos viciam...


Participar de algo assim, é o que dá sentido ao sem-sentido das políticas estacionadas e desvirtuadas. Planejamentos equivocados, interesses egocentrados fazem do esporte esse barco sem rumo, vagueante ou guiado pelo sabor dos ventos intermitentes. O encontro, o sorriso, o desafio, a luta, a paixão, a chama que permanece: só isso explica a relutante vontade de continuar.

Daqui e dali vou tirando os pedaços, trechos de emoções que a quadra revela e sintetiza.
Os rostos, os sorrisos, os momentos... A sensação incontestável de que algo nos preenche, uma espera reconfortante pelo reencontro: na rotina dos treinos que são necessários, ou no domingo de manhã, em que já não há outro querer se não o de estar na quadra, jogando, treinando. 

A bola, a cola, os rituais do jogo e do treino. No handebol, o mundo que queremos é alimentado por aquilo que a paixão não deixa acabar.



domingo, 20 de novembro de 2011

A diferença entre ser o melhor e ser privilegiado. Ou de rios que não encontram o mar.

Tenho assistido a muitos jogos de handebol nos últimos dias. Minha profissão exige. Mas se fosse só pela profissão, acho que não assistiria a tantos. Movo-me pelo que tende a disparar, dentro de mim, aqueles picos de arrebatamento, os clarões que desintoxicam as paredes duras de artérias que vão se acostumando a só viverem de pressões desnecessárias, de brigas repetitivas e monótonas.

É assim que vou vendo escoar a vida. Um realimentar contínuo de sonhos que se perdem, de outros que se renovam. Vejo atletas reunidos pela simples vontade de extravasar e mostrar talentos que logo ali na frente serão desperdiçados. Aqui, no Handebol, o escoadouro é mais forte que a nascente e um rio que percorreria quilômetros antes de encontrar o mar, acaba secando nos desfiladeiros e nas areias quentes. Vejo atletas que se vangloriam por pertencer a uma elite minguante ostentando ares de majestade. Governam para ninguém. Sentam em tronos de pó. Vejo os mesmos atletas acostumados com as mesmas decisões, de placares quase iguais e de festejos semelhantes. Vejo dirigentes e técnicos imaginando que estar acima "na tabela" é estar acima de alguém. Não é.




















Por isso é que tenho visto muitos jogos. Ainda procuro os olhares felizes com os sonhos permitidos, os destemperos reincidentes, as vontades recalcitrantes. Ainda procuro os prazeres despretensiosos. Quase não os acho. Mas ainda os há. Eles aparecem num lance qualquer, inesperado, sem importância aparente. Ou num jogo decisivo também. Aí, esse destempero heterogêneo, indisciplinado mas objetivo, destoante e intenso, surge e faz reviverem as esperanças de uma terra quase feita de pó.

O handebol, nesse pequeno momento, ressurge mostrando a todos que o errado não é o que acontece na quadra, mas o que antecede e o que ultrapassa tudo isso. E, ora, estamos lá para ver, prestigiar, o melhor dos mundos, aquilo que faz a gente querer voltar, querer continuar, querer torcer.

Mas o momento da quadra, do jogo tem sofrido com a incompetência continuada que mina o Esporte e o faz sair derrotado; tem sofrido com políticas públicas que se preocupam com resultados sempre instantâneos; tem sofrido, enfim, com uma estrutura que desprivilegia os amantes, os aficionados e, sobretudo, aqueles que vão se perdendo porque não encontram chances de mostrarem ou continuarem mostrando seus talentos, esculpidos com longos sacrifícios nas categorias de base dos mais diversos campeonatos, dos "mais" importantes e dos "menos" visíveis...


Vejo muitos jogos, empolgo-me com poucos. Brasil e Argentina no Pan não me revirou o estômago como gostaria. Não, lá jogaram poucos de verdade, outros se alimentaram de sua egolatria e se devoraram a si mesmos enquanto jogavam seu handebol. No Brasil, muitas vezes, se confunde a ideia de ser o melhor com a noção equivocada que cultuamos de estar entre os privilegiados nisso ou naquilo. Olho, sobretudo, para os que são os melhores mesmo estando entre os desprivilegiados. Uma competitividade justa se dá quando aumentamos a chance de quem está do lado de fora, incluindo-o, ou dando a chance do desprivilegiado se incluir. Se não seremos obrigados a vermos secarem os estoques de talento que insistem em brotarem dos chãos mais ásperos e quentes.

Bem, vejamos.

Há algum tempo me deparo com o fato de que uma imensa quantidade de atletas maduros nas informações acumuladas e no talento despertado são obrigados a pararem sua iniciante carreira porque não conseguem espaço para treinar em clubes estruturados. Temos produzido, bem ou mal (e meu palpite é que é mais para mal do que para bem) novos atletas em número razoável. Mas não tem havido uma correspondência mínima na abertura de novos clubes, novas propostas ou novos investimentos.

Resultado: 21 anos é o aniversário da morte de muitos para o esporte. Continuar é impossível. Sobrevive quem assim? O esporte morre apesar dos campeonatos continuarem acontecendo.

Sempre ouvimos e reproduzimos que o Esporte é excludente, que ele é a ponta de lança de uma sociedade injusta que premia só os melhores, só os campeões ou, que, aplaudindo pretensos teóricos, arbitrários críticos de realidades não vividas, erram o alvo ao atacarem por trás o capitalismo que pretendiam ferir. Esquecem-se dos modelos ainda vigorantes de Esporte, vide a atuação de Cuba no último Pan-Americano realizado em Guadalajara  Será, então, que o Esporte é excludente mesmo? Não em alguns países. O Esporte precisa ser pensado como parte de uma sociedade que visa diminuir injustiças, de valorizar pessoas, coroar esforços, prestigiar a festa, o congraçamento!


Pra resumir: o Esporte é excludente na medida em que se pensa na medalha como fachada, como panaceia, como desculpa para continuar jogando para baixo do tapete essas mesmas injustiças que se asseveram com a vitória.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Um garoto e sua bola!


 








Participando do segundo circuito mirim de handebol masculino realizado em Diadema, dez horas de jogos, de sorrisos, de inícios, de consolidações, cada equipe trazendo sua realidade, suas experiências e se pondo à prova, concluo quase que de forma definitiva: esporte - da maneira como se deve perceber e incentivar todo o início -  e festa devem andar sempre juntos!




Competir não é ruim por si só. As críticas que sempre se fizeram a quem compete e à sanha advinda do destempero diante da derrota é que são, essas sim, maléficas. O que fazemos quando estamos competindo é que deve ser o objeto mais cuidadoso do nosso foco: condutas, valores, procedimentos, experiências são insistentemente alimentados quando lidamos com o esporte. Mais do que perder ou ganhar, está em jogo o "como perder" e o "como ganhar". Vejo muitos exemplos, bons e ruins. Venho percebendo que os melhores exemplos reiteradamente  não se dão com discursos acalorados, com "lições de moral", com títulos que se acumulam, com amigos que se apinham ao redor, com blá-blá-blás...


A cartilha que é infalível traz alguns elementos incontestáveis: serenidade, paixão, perspicácia, obstinação e persistência. Reunidos em uma pessoa ou em uma equipe não garantem, de forma alguma a chave da esperada vitória. Constrói, outrossim, um castelo forte demais.


Alegrar-se com a alegria das crianças. Vi isso em alguns. Em muito poucos. Devia ter visto em mais pessoas.

Mas, não é assim mesmo que os avanços mais sólidos acontecem? Imperceptíveis e salpicados de uma intensa e desmedida alegria para quem os conquista? Só para quem os conquista... Para mais ninguém. O mundo ao redor parece o mesmo para todo o restante, mas, num certo ponto, para aquela pessoa que chegou onde talvez não esperasse chegar, especificamente esse avanço representa o passo mais importante.

 Assim, sem alardes, sem gritos, sem desespero, o mundo passa a girar por um segundo ao seu redor, você, o centro do mundo.


Pois, é. Senti que por um segundo, o centro do mundo era mesmo ali, numa periferia da região metropolitana, em que garotos afoitos, vibrantes, felizes, tateantes, medrosos, deslumbrados disputavam uma bola como talvez nunca mais disputem.
Nesses poucos instantes, a bola valia mais que o ouro mais reluzente, o gol, representava a riqueza mais almejada. Um único gol, um salto, ele e o goleiro. Pronto. Alegria completa. Em dez horas, quantos sorrisos foram disseminados? Ajudou-se a diluir a poluição do ar? Estava em jogo o futuro de algo "mais" importante? Não mesmo... Mas, aqui, diluiu-se alguma resistência, bem aqui no peito. Para os garotos, mesmo na derrota, alguns desses tesouros puderam ser levados: um gol impossível, um salto para o infinito, uma interceptada inesperada, um passe tresloucado e original, um grito de comemoração, um aperto de mão entre adversários.


Esses presentes podem até ficar esquecidos, podem amarelar, mas estarão lá, guardados em algum pedaço desse peito aberto pela emoção inesperada, peito e coração esses que de agora em diante estarão, inadvertidamente, sempre lutando contra as mesmices, o tédio, o despropósito da vida. Aí, então, poder-se-á dizer que realmente nesse segundo inesperado, o centro do mundo eram essas crianças lutadoras, afoitas, indecisas e felizes.


Ao fim e ao cabo, sabe onde está a vitória disso tudo? Poder, sem saber nunca a resposta ao certo, ter criado em algum improvável garoto uma fagulha; poder ter despertado uma paixão... Sequer havia algo lá no peito desse garoto e de repente, cheio de um entusiasmo sem motivo identificável para ele, a mão começa a coçar procurando a bola que lhe mudou os sentidos, os olhos se viram agitadamente procurando aquele pequeno quadrado da quadra que o fez feliz demais e o corpo, como em uma dança sem coreografia, se põe a refazer a mágica do salto, do gol, do grito.


Bom, mas isso pode ser apenas devaneio mesmo e o que vi lá pode também ser só uma euforia passageira de um garoto qualquer.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Pequeníssimos passos. Invisíveis avanços.






Eu, com minhas lembranças, pego-me pensando que gostaria de ter tido professores mais rígidos, mais insistentes, mais provocadores. De lá teria tirado mais lições, mais situações para me colocarem à prova. Aqueles que me foram pretensamente mais complacentes não me fizeram crescer e aprender o tanto quanto gostaria. Entre um sorriso fácil mas distante, de um lado, e um olhar severo mas constante, de outro lado, prefiro esse nem sempre amigável contato, provocador de conflitos e incertezas, tão pouco esclarecedor...
Pois, é. O que é bonito no contato com outras pessoas é essa incerteza aberta e chance dada de reconhecer na distância do tempo, o que de fato se levou da vida. 

 
A super-proteção não leva a lugares tão proveitosos, nos faz acomodar de um jeito prejudicial demais. Viramos o objeto que se quer admirar e não a pessoa que precisa se acostumar com o mundo.


No cotidiano desse recomeço em Diadema, venho percebendo que preciso ser austero para provocar amadurecimentos mais rápidos. Preciso ser distante para impedir possíveis afrouxamentos. Preciso criar um ambiente bom para o aperfeiçoamento. O esporte exige um ambiente fechado, livre de interferências, voltado para a eficiência máxima. Suor e atenção, luta e persistência... Sobretudo saber lidar com o fracasso, com os erros, com as frustrações. Aí, se forja um talento. Ai, um espírito combativo, justo e ciente de suas habilidades tem a chance de aparecer.

Venho me acostumando a tentar me alegrar com os pequenos avanços. Tão pequenos que para todos os outros ainda não aparecem a olhos vistos. Um passe bem executado, uma movimentação inteligente, um gol tramado na percepção fina dos espaços criados... Um só... Um jogo todo e minha alegria se concentra nesse pequeno momento invisível frente a adversários superiores. Um olhar sobre os ombros para mim que confidencia no atleta uma satisfação fugaz e intensa que é tão difícil de se ter em qualquer outro momento. De repente, na velocidade de um relâmpago, fico feliz. Acumulo pequenos raios desses de felicidade. Guardo comigo sabendo que no próximo lance, no próximo segundo, a exigência sobre esse olhar terá mudado, terá aumentado, como prova silenciosa de que querer sempre mais não é tão ruim assim, se ao final, pudermos ir recolhendo esses tesouros esparsos, difíceis de encontrar.



Assim, caminhamos aprendendo a fazer nosso próprio caminho.

Sempre quis ter uma equipe estruturada e a chance de me dedicar plenamente a ela. Só que esse querer tem que sofrer o impacto de uma dura pancada para a cada dia, merecer se transformar em algo palpável. Talvez, sem o saber como, de forma tateante, errante, o ideal de uma formação, do esporte, de uma paixão, seja esse mesmo, construir caminhos. A solidez vai depender dos ingredientes que conseguirmos juntar aos sonhos. Temos os nossos... ingredientes, mas também sonhos.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

O que importa mesmo é vencer!!!

Para além das ladainhas frívolas de teorias banais... O que importa mesmo é vencer! O gosto amargo da derrota encontra tantas outras justificativas que beneficiam paralisias sistêmicas e perpetuam a constante falta de atenção para com o Esporte. Sempre fui contra quem perde e culpa a hegemonia do adversário: dupla incompetência. A de não assumir os erros e a de tirar o mérito de quem venceu. O único problema disso tudo é que se acaba, na imensa maioria das vezes,  responsabilizando quem menos deveria levar a má fama. A falta de subsídios, de acompanhamento, de condições de trabalho, de dinheiro, de organização, são os principais problemas, reiterados por insistentes fórmulas que alimentam o círculo de manutenção dos mesmos dirigentes e das mesmas ideias.
Não tem como fugir. A marca mais visível de uma competência - numa sociedade que sempre valorizou o melhor - é a vitória incontestável perante seu adversário mais forte. E isso tem seu lado bonito se não for absolutizado. Explico melhor... É no cotidiano dos embates, das disputas, que essa competência se testa, se reafirma, se renova, se recicla...
No domínio temporário, fugaz, sempre oscilante, está a força de um querer mais. De um querer modificar-se, melhorar, sobrepujar. O meu melhor já não me basta quando ele encontra-se confrontado de igual para igual com os conhecimentos e chances que meus adversários possuem. Sair dessa situação incômoda, impele-me a buscar novas saídas, inovar, conhecer mais.

Sinal de falência de uma modalidade é verificar que essa oscilação, essa alternância deixa de existir. Aí, o Esporte morre. Aí, toda disputa vira encenação de algo que não se consegue criar naturalmente. O terreno se abre às famosas e constantes armações, às proteções inconsequentes de títulos que se conquistam às custas de uma competitividade questionável. 

Hoje, no handebol paulista (e, por extensão, no handebol nacional), o campeonato se faz com duas equipes mais equilibradas e um punhado de outras tantas equipes que se marginalizam na competição. Ser campeão nessas condições é muito cômodo para quem ganha. No entanto, é péssimo para a modalidade que se vê encapsulada e remetida a uma falsa disputa. Infelizmente, para nós, ganhar, nesse sentido é também perder...
A título de curiosidade, façamos a seguinte indagação. Quem garante, apesar da onda de títulos recentes, que o próximo campeão mundial ou olímpico será, novamente, a França? Em contrapartida, quem deixaria de apostar que, muito provavelmente, o próximo campeão da Liga Nacional Masculino será o Pinheiros? Ou, ainda, com alguma chance de erro, a Metodista? Sinais sérios, ao meu ver, de uma falência que precisa ser diagnosticada com mais precisão e sanada o quanto antes, para o bem de todos que praticam handebol.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Recomeçando...

A gente vai crescendo e ouvindo repetidas vezes que o ano só começa depois do Carnaval... E daí, sem saber direito, a gente também ajuda a ir reforçando a falsa ideia de que brasileiro não trabalha, não se esforça, não merece o (pouco, quase nada) que ganha. Mentira deslavada! Acordo cedo. Não mais do que a maioria dos brasileiros. Vejo metrôs lotados, ônibus apinhados de um povo trabalhador e pronto para honrar esse parco salário. O dia nem clareia e o ritmo louco já se faz notar pelos empurrões, pelo trânsito caótico, pelas filas. O rápido e frio cumprimento nos coloca na esteira da seriedade do mundo do trabalho.

Assim me vi, logo em janeiro, quando motivado pela notícia tão aguardada de que uma possível entrada na Federação Paulista de Handebol concretizara-se finalmente. Férias pela metade, ânimo redobrado. Lá estávamos nos, eu o Marcos, prontos para um ano que tem dividido notícias boas com outras nem tanto assim. Uma vontade enorme contraposta a uma lista maior ainda de empecilhos. Nossa única garantia para o início do trabalho era o chamariz para a disputa de um campeonato oficial. Sem auxílio para o transporte, sem ajuda de custo, sem fisioterapeuta, sem quadra oficial, sem tradição, vimos murcharem algumas das expectativas iniciais. Restaram-nos alguns poucos obstinados garotos movidos por uma vontade oscilante, pelas dúvidas de tomada de decisão quanto aos horários de trabalho, estágios, cursos e... o handebol.

Um pequeno grupo vem tomando forma. Alguns dos garotos e muitas das garotas puderam ter a oportunidade de adentrar num (ainda) restrito grupo de privilegiados jogadores de handebol. A chance que não viria em outros clubes, foi dada por Diadema. Um pequeno passo num imenso terreno a ser desbravado, enfrentado e vencido. Um desafio que se anuncia, que se abre: tornar inexperientes e improváveis jogadores em atletas apaixonados pelo que fazem. Formar uma equipe a partir das brechas deixadas por uma modalidade acostumada a ser o palco de uma elite ensimesmada.

Fico com saudade dos atletas que por aqui passaram e fazem me orgulhar de um trabalho movido pela dedicação, pelo prazer, mas também por um suor desgastante e sofrido. Eles são, de verdade, minha maior inspiração. O caminho foi aberto por tantos atletas que sempre quiseram estar com a gente mas tiveram que buscar em outros clubes os meios de extravasar essa vontade de jogar, de fazer diferença, de se superar.



Choro, raiva, desilusão, desânimo, angústia são alguns dos sentimentos que irão acompanhar a trajetória de quem inicia um caminho difícil e precisa amadurecer ainda mais rápido do que seria esperado.  E, nesse meio tempo, talvez alguns descubram que maior que a cobrança dos técnicos, o insuportável mesmo é a cobrança que vem de dentro de nós mesmos. Nesse momento, então, quando isso de fato ocorrer, no começo ou em qualquer outro ponto dessa trajetória, possa-se descobrir que tenha sido marcado o gol mais importante. É o momento em que descobrimos o sentido da palavra superação, da palavra talento, da palavra paixão. Alguns poucos treinos com todo mundo... 


O grupo foi tomando consciência de que nada se consegue sem esforço, sem dedicação, sem empenho constante. Muitas vezes, sem dinheiro. Andando alguns quilômetros até chegar no treino. Acordando no dia seguinte, ainda com o corpo dolorido e a cabeça cheia das broncas merecidas ou injustas. As derrotas no São Caetano Cup, fizeram-nos acordar para a realidade dura. Os Jogos da Juventude, nesse sentido, vieram num progresso, servindo para dar mais cara de grupo e ajudando a reforçar amizades que se tornarão presentes por muitos anos ainda. 


Muitas dessas amizades permanecerão por um período bem maior do que o do tempo de quadra. E o que foi vivido, descobrir-se-á único, verdadeiro, intenso e reconfortante. Tão reconfortante quanto aquele final de treino que nos consumiu a derradeira força, que nos fez buscar lá no fundo do peito o último ar. Tão reconfortante quanto aquele elogio que ninguém fez, mas que conseguiu sair de dentro da gente mesmo e nos amparou no sonho de buscarmos algo que, em princípio se mostrava inalcançável. 


Assim, reiniciamos. E não é dessa forma mesmo que se começa? Puxando outros tantos com a gente, servindo de exemplo e dando oportunidade?

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Uma voz destoante, um blog de qualidade: mil por cento. Mais alguns comentários sobre o handebol nacional.


Revirando os posts do meu facebook, vi que um garoto (Eduardo Gomes) que treinou comigo compartilhou o último texto desse blog que desconhecia. Li e acho que no Esporte, a falta de textos críticos e de comentadores atentos, seu blog merece ser acompanhado. Ex-atleta de handebol, Kiko Andrade parece conhecer bem algumas das incríveis deficiências do Esporte nacional. Aponta a irresponsabilidade da condução dos financiamentos públicos para o Panamericano.

Centra-se na crise institucional e de comando do handebol mas aponta outras tantas deficiências que ajudam a entender melhor as agruras insanáveis a curto prazo. Exige-se - e concordo com ele - uma mudança de comando. Mas não só isso. Concepções apequenadas de dirigentes, treinadores, clubes e secretárias de esporte colocam o handebol e o esporte de base sob difíceis e inférteis terrenos.

Como a planta que não é regada. O handebol murcha, perde o seu brilho, deixa de encantar e fica fadado a uma morte anunciada. Os respingos que lhe dão sobrevida vêm de que ainda se alimenta de uma esperançosa saída ou algum horizonte ainda distante.

Há a necessidade de irmos da indignação à ação. Acho que a internet tem acumulado forças inexploradas nesse sentido. Fico feliz por encontrar finalmente um blog que me inspire não por concordar com todos os argumentos e com todas as saídas discutidas, mas porque me coloco do lado, assim como esse blog, dos que distoam, dos que não são ouvidos e fazem o handebol ainda ser uma paixão, bem ali, onde não se colocam holofotes, onde perdura o esforço incansável de garotos e garotas que encontram sentido praticando uma modalidade que lhes fazem mais felizes. Somássemos as desilusões e as críticas de todos ainda não teríamos a dimensão dos malefícios causados por pessoas tão pequeninas dirigindo o handebol... Como é que nos conformamos a assistir uma única partida que valha a pena o ano inteiro? Uma Liga Nacional tem a dimensão de um único jogo equilibrado... As mesmas equipes à frente, os mesmos atletas e ainda somos apaixonados. Dá para aceitar que o Pinheiros tenha ganho no masculino em todas as categorias no naipe masculino? Dá para aceitar que o mesmo Pinheiros e quem quer que esteja à frente dessa maneira, se contente em ser rei de um império tão medíocre?

A esse propósito, lembro-me de uma consideração que fez a Dayane dos Santos as vésperas de um mundial quando um repórter perguntou-lhe a respeito de sua principal rival, que lesionada, não disputaria o campeonato.

Sua resposta, resume um pouco do que é o espírito de quem também se emocionou ao ver lindos jogos no Mundial da Suécia, e espelha uma máxima que só quem está muito distante da realidade de quem compete, não pode alcançar...

Não conseguirei reproduzir o que ela disse exatamente, mas resumo. Para ela, não estar disputando o Mundial ou qualquer outra competição com os melhores não era a mesma coisa. Decepcionada, sabia intimamente que ganhar não competindo com as melhores ginastas não seria a mesma coisa. Uma medalha garantida previamente. Digna e justa, mas ainda assim, um pouco decepcionante.

Quando se quer ganhar... Se quer ganhar por ser o melhor entre os melhores, respeitando os companheiros e exigindo que eles também possam fazer o melhor. A vitória é também, nesse sentido, um teste, uma avaliação de que se acertou ou não nos passos que foram dados até chegar a esse ponto.

Isso provou a França e tantas outras equipes bem preparadas que carregam consigo não só uma estrutura voltada para além dos próprios umbigos mas que dividem a responsabilidade de expandirem ainda mais os limites do handebol mundial. Para eles, de alguma forma é preferível ganhar de quem sabe tanto quanto eu. E que o esforço que me garante no topo é o resultado de toda uma política de investimento, expansão, conhecimento e ousadia.

Aqui, ainda se acha que ostentar o título de campeão, disputando com quem se disputa, é algo grandioso e justificador de empáfias absurdas. Aqui, vale a máxima de que se é rei caolho em terra de cegos.

Congratulo-me com a sua luta. Ela é minha também. Ela é, pelo que tenho visto em alguns comentários que se propagam nas redes sociais, de muitos outros: não ouvidos, apaixonados, resistentes, esperançosos.